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STJ – Primeira Seção fixa teses sobre prazo prescricional para cobrança judicial do IPTU

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou a tese de que o marco inicial para contagem do prazo de prescrição da cobrança judicial do Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) é o dia seguinte à data estipulada para o vencimento da cobrança do tributo.

No mesmo julgamento, o colegiado também definiu que o parcelamento de ofício (pela Fazenda Pública) da dívida tributária não configura causa suspensiva da contagem da prescrição, tendo em vista que não houve anuência do contribuinte.

As duas teses foram estabelecidas em julgamento de recursos especiais repetitivos (Tema 980), e permitirão a definição de ações com idêntica questão de direito pelos tribunais do país. De acordo com o sistema de recursos repetitivos, pelo menos 7.699 processos estavam suspensos em todo o Brasil aguardando a solução do tema pelo STJ.

Lei local

Relator dos recursos especiais repetitivos, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho explicou inicialmente que, nos casos de lançamento do tributo de ofício, o prazo prescricional de cinco anos para que a Fazenda Pública realize a cobrança judicial de seu crédito tributário começa a fluir após o prazo estabelecido pela lei local para o vencimento do pagamento voluntário pelo contribuinte.

Por consequência, apontou o ministro, até o vencimento estipulado, a Fazenda não possui pretensão legítima para ajuizar execução fiscal, embora já constituído o crédito desde o momento em que houve o envio do carnê para o endereço do contribuinte.

“A pretensão executória surge, portanto, somente a partir do dia seguinte ao vencimento estabelecido no carnê encaminhado ao endereço do contribuinte ou da data de vencimento fixada em lei local e amplamente divulgada através de calendário de pagamento”, afirmou o relator.

Cota única

Segundo Napoleão, nas hipóteses em que o contribuinte dispõe de duas ou mais datas diferentes para o pagamento em parcela única – como no caso específico dos autos analisados –, considera-se como marco inicial do prazo prescricional o dia seguinte ao vencimento da segunda cota única, data em que haverá a efetiva mora do contribuinte, caso não recolha o tributo.

“Iniciado o prazo prescricional, caso não ocorra qualquer das hipóteses de suspensão ou interrupção previstas nos arts. 151 e 174 do CTN, passados cinco anos, ocorrerá a extinção do crédito tributário, pela incidência da prescrição”, disse o relator.

Suspensão

Em relação à possibilidade de suspensão da contagem da prescrição em virtude do parcelamento de ofício, o ministro relator destacou que a liberalidade do Fisco em conceder ao contribuinte a opção de pagamento à vista ou parcelado, independentemente de sua concordância prévia, não configura uma das hipóteses de suspensão previstas no Código Tributário Nacional.

Segundo o ministro, o parcelamento também não constitui causa de interrupção da prescrição, já que há a exigência legal de reconhecimento da dívida por parte do contribuinte.

“O contribuinte não pode ser despido da autonomia de sua vontade, em decorrência de uma opção unilateral do Estado, que resolve lhe conceder a possibilidade de efetuar o pagamento em cotas parceladas. Se a Fazenda Pública Municipal entende que é mais conveniente oferecer opções parceladas para pagamento do IPTU, o faz dentro de sua política fiscal, por mera liberalidade, o que não induz a conclusão de que houve moratória ou parcelamento do crédito tributário, nos termos do art. 151, I e VI do CTN, apto a suspender o prazo prescricional”, disse o ministro ao fixar as teses repetitivas.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1641011 REsp 1658517

Fonte: http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noticias/Not%C3%ADcias/Primeira-Se%C3%A7%C3%A3o-fixa-teses-sobre-prazo-prescricional-para-cobran%C3%A7a-judicial-do-IPTU

Mudança de entendimento acerca da incidência tributária nos contratos de permuta

Em decisão publicada no dia 21 de novembro de 2018, o Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) confirmou que, sobre os contratos de permuta de imóveis de igual valor não incidem tributos federais, como PIS, COFINS, IRPJ e CSLL.

Com base no entendimento da 2ª Turma do STJ, nas negociações em que o contrato de permuta é utilizado, não há, na maioria das vezes, faturamento ou receita, impossibilitando o cálculo do tributo que utiliza tais valores como base de cálculo.

O voto de um dos ministros ressaltou o acerto da Corte de origem, qual seja o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (“TRF4”), ao interpretar o art. 533 do Código Civil no sentido de que, independente das disposições previstas para a compra e venda se aplicarem à permuta, tributariamente não há equiparação nas operações.

Conclui o Magistrado que, mesmo havendo um tratamento igual entre o contrato de permuta e o daquele utilizado na compra e venda, aplicam-se conceitos tributários diferentes, pois a troca entre bens de valor igual é uma mera substituição de ativos e não uma forma de receita ou lucro.

A jurisprudência já caminhava nesse sentido: Em acórdão proferido, o TRF4 votou por afastar a cobrança de IRPJ, pois o imóvel recebido como forma de pagamento por meio da permuta não integrava a base de cálculo do imposto.

Os contribuintes conseguiram outras vitórias semelhantes nos Tribunais Regionais Federais, contudo no STJ essa é a primeira vez que o mérito do art. 533 do Código Civil é analisado, criando jurisprudência que pode favorecer outras discussões sobre o tema.

As decisões são positivas, principalmente, para as empresas no ramo da construção civil. Com a possibilidade de oferecer uma troca de imóveis, no mesmo valor, sem que seja obrigado a recolher os tributos federais, as construtoras e incorporadoras diminuem os tributos que, muitas vezes, são obrigadas a arcar para manter a regularidade fiscal.

Fonte: http://www.tostoadv.com/boletim-tributario-stj-mudanca-de-entendimento-acerca-da-incidencia-tributaria-nos-contratos-de-permuta/14.02.2019

Supervisor que usava carro fornecido pela empresa não receberá horas de deslocamento

A situação foi equiparada ao uso de veículo próprio.

A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho excluiu da condenação imposta à Companhia Brasileira de Energia Renovável (Brenco) o pagamento de horas de deslocamento (in itinere) a um supervisor que tinha à sua disposição veículo fornecido pela empresa para que fosse ao trabalho por conta própria. Embora o local não fosse servido por transporte público regular, a SDI-1 entendeu que a situação se equipara ao uso de veículo próprio.

O relator dos embargos apresentados pela Brenco contra a condenação, ministro Márcio Eurico Vitral Amaro, explicou que o artigo 58 da CLT e o item I Súmula 90 do TST estabelecem como requisito para o direito às horas de deslocamento a condução fornecida pelo empregador até o local de trabalho de difícil acesso ou não servido por transporte público regular. O direito, segundo ele, se justifica nos casos em que o transporte sujeita os empregados a horários mais rígidos e prolongados, o que não seria o caso do supervisor.

“Essa situação específica assemelha-se muito mais à hipótese de veículo próprio, em relação à qual não há o direito a horas in itinere“, observou o relator. Nesse contexto, segundo o ministro, o caso se submete à regra geral do artigo 58 da CLT, segundo o qual “o tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho”.

Ficaram vencidos os ministros José Roberto Freire Pimenta, Augusto César Leite de Carvalho, Hugo Scheuermann e Cláudio Brandão.(E-ARR-766-85.2013.5.18.0191)

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho, 07.02.2019

Pagamento de pensão vitalícia em parcela única permite aplicação de redutor

A forma de pagamento é mais vantajosa para o empregado.

A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho aplicou redutor de 30% ao valor da pensão deferida a título de dano material a um montador da Mahle Metal Leve S.A. que teve perda total da capacidade de trabalho em razão de doença ocupacional. A pensão, devida até que o empregado complete 69 anos, será paga em parcela única.

A condenação ao pagamento de indenização foi deferida em parcela única porque, segundo o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP), essa foi a forma requerida pelo empregado e autorizada pelo parágrafo único do artigo 950 do Código Civil. No recurso de revista, a Mahle alegou que o pagamento de uma só vez o privilegiaria.

Deságio

O relator do recurso, ministro Márcio Eurico Vitral Amaro, observou que cabe ao juiz decidir, mediante critérios de proporcionalidade e de razoabilidade e da análise das demais circunstâncias do caso, se o pagamento da indenização será feito em parcela única ou de pensão mensal. “No entanto, o ressarcimento do dano material em parcela única assume expressão econômica superior e seguramente mais vantajosa em relação ao pagamento diluído, efetivado em parcelas mensais”, assinalou. Por essa razão, ele entendeu que devia ser aplicado um redutor ou deságio sobre o valor fixado. A decisão foi unânime. (RR-1876-80.2010.5.15.0071 )

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho, 07.02.2019

Turma mantém Condenação de Condômina por ofensas ao Síndico no Whatsapp

No 1º grau, o síndico havia ajuizado ação de indenização em desfavor de três moradoras do condomínio.

A 4ª Turma Cível do TJDFT manteve, por unanimidade, sentença que condenou uma condômina ao pagamento de indenização por danos morais, em virtude de ofensas proferidas ao síndico do condomínio por meio do aplicativo WhatsApp.

No 1º grau, o síndico havia ajuizado ação de indenização em desfavor de três moradoras do condomínio. Afirmou que, após a realização de Assembleia Geral de Condomínio, as rés, integrantes de um grupo no aplicativo, restrito aos condôminos, proferiram diversos comentários depreciativos da sua atuação administrativa, tais como “só tem roubo” e “na certa tem caixa 2”. O juiz julgou parcialmente procedente o pedido e condenou uma das rés ao pagamento de indenização de R$ 2.500,00.

Ao julgar o recurso, o desembargador concordou com os termos da condenação e acrescentou que “a imputação da prática de ‘caixa dois’ não se confunde com meras críticas, pois atinge a honra, a reputação e a dignidade do autor/apelado, excedendo, assim, o direito à liberdade de expressão (CF/88, art. 5º, IV)”. O julgador apontou, ainda, o elevado grau de lesividade do ato ilícito, “pois as ofensas foram perpetradas em grupo de Whatsapp com, aproximadamente, 213 participantes, todos de convivência diária com a vítima”.

Fonte: TJDFT
https://www.jornaljurid.com.br/noticias/turma-mantem-condenacao-de-condomina-por-ofensas-ao-sindico-no-whatsapp

Ex-sócio não é responsável por obrigação contraída após sua saída da empresa

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso especial do ex-sócio de uma empresa por entender que, tendo deixado a sociedade limitada, ele não é responsável por obrigação contraída em período posterior à averbação da alteração contratual que registrou a cessão de suas cotas.

No caso em análise, o recorrente manejou exceção de pré-executividade após ter bens bloqueados em ação de cobrança de aluguéis movida pelo locador contra uma empresa de cimento, da qual era sócio até junho de 2004. Os valores cobrados se referiam a aluguéis relativos ao período de dezembro de 2005 a agosto de 2006.

Em 2013, o juízo da execução deferiu pedido de desconsideração da personalidade jurídica da executada, por suposta dissolução irregular da sociedade, para que fosse possibilitada a constrição de bens dos sócios, entre os quais o recorrente. Ele então alegou a sua ilegitimidade passiva, pois a dívida se referia a período posterior à sua saída.

No entanto, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro entendeu que o ex-sócio responderia pelas obrigações contraídas pela empresa devedora até junho de 2006, quando completados dois anos de sua saída.

No recurso especial, o ex-sócio alegou que o redirecionamento da execução para atingir bens de sua propriedade seria equivocado, assim como a consequente penhora on-line realizada em suas contas bancárias, não podendo ele ser responsabilizado por fatos para os quais não contribuiu.

Responsabilidade restrita

Para o relator do recurso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva, a solução da questão passa pela interpretação dos artigos 1.003, 1.032 e 1.057 do Código Civil de 2002.

“A interpretação dos dispositivos legais transcritos conduz à conclusão de que, na hipótese de cessão de cotas sociais, a responsabilidade do cedente pelo prazo de até dois anos após a averbação da modificação contratual restringe-se às obrigações sociais contraídas no período em que ele ainda ostentava a qualidade de sócio, ou seja, antes da sua retirada da sociedade”, disse.

Segundo o relator, o entendimento das instâncias ordinárias violou a legislação civil ao também responsabilizar o sócio cedente pela dívida executada.

Dessa forma, o ministro acolheu a exceção de pré-executividade e excluiu o ex-sócio do polo passivo, uma vez que “as obrigações que são objeto do processo de execução se referem a momento posterior à retirada do recorrente da sociedade, com a devida averbação, motivo pelo qual ele é parte ilegítima para responder por tal débito”.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1537521

Fonte: http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noticias/Not%C3%ADcias/Ex%E2%80%93s%C3%B3cio-n%C3%A3o-%C3%A9-respons%C3%A1vel-por-obriga%C3%A7%C3%A3o-contra%C3%ADda-ap%C3%B3s-sua-sa%C3%ADda-da-empresa

Justiça libera estrangeiros de depósito prévio para ajuizamento de processo

A Justiça tem liberado empresas ou pessoas físicas estrangeiras de depósito prévio para o ajuizamento de ação. A chamada caução é de 20% sobre o valor da causa e é exigida, com base no artigo 83 do Código de Processo Civil (CPC) de 2015, de quem está fora do país ou deixou de residir ao longo do processo.

Esses valores têm que ser depositados por empresas que não tenham sede ou bens imóveis em território brasileiro. A motivação é assegurar a existência de valor suficiente para o pagamento das custas e dos honorários de advogado da parte contrária nas ações propostas na Justiça.

Segundo o advogado Renato Moraes, especialista em contencioso do Cascione Pulino Boulos Advogados, a exigência – prevista desde o CPC de 1973 – sempre foi um grande empecilho para os estrangeiros, pois nem sempre dispõem desses valores.

“Além de pagar advogado, as custas do processo que começam em 1%, ainda têm [as empresas] que dispor de 20% do valor discutido”, diz o advogado. Para ele, trata-se de “um óbice tanto do ponto de vista financeiro quanto operacional”.

Para livrar estrangeiros da obrigação, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) tem se baseado normalmente nas exceções previstas no CPC. Entre elas está a dispensa fundamentada em acordo ou tratado internacional de que o Brasil faça parte. Outras situações são execução fundada em título extrajudicial (cheque ou promissória, por exemplo) ou reconvenção – ação do réu contra o autor no mesmo processo em que aquele é demandado.

Nas decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os ministros vão além do que está previsto na lei para excluir a obrigação. Eles aceitam um pedido, por exemplo, quando a empresa estrangeira possui representante no Brasil.

Com base nas exceções do CPC, uma empresa francesa conseguiu no TJ-SP se livrar do pagamento de caução ao citar o Acordo de Cooperação em Matéria Civil entre o Brasil e a França, promulgado pelo Decreto 3.598, de 2000. A companhia tinha entrado com ação para discutir a apreensão supostamente indevida de uma carga por uma companhia de transporte marítimo e logística, no valor de US$ 63 mil.

Em ocasiões recentes, segundo o advogado Renato Moraes, o Brasil assinou diversos acordos internacionais que buscam promover o acesso à Justiça e afastam a necessidade de caução. Entre eles, a Convenção sobre o Acesso Internacional à Justiça, internalizada pelo Decreto nº 8.343, de 2014, e o Acordo de Cooperação e Assistência Jurisdicional em Matéria Civil, Comercial, Trabalhista e Administrativa entre os Estados Partes do Mercosul, a República da Bolívia e a República do Chile, de 2009.

A partir desses tratados e convenções, os estrangeiros têm conseguido excluir esse pagamento, de acordo com Moraes. Há acordos com cerca de 35 países. Estão de fora da lista, porém, Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha. “Quando não há acordo, existe mais dificuldade, diz o advogado.

De acordo com a advogada Marília Minicucci, do Chiode Minicucci Advogados, além das exceções do Código de Processo Civil, a jurisprudência também tem excluído a obrigação de empresas que tenham representante legal no país. “Deste modo não torna-se temerária a impossibilidade de pagamento de valores devidos, em caso de sucumbência”, afirma.

O argumento foi aceito em julgamento ocorrido em agosto passado na 3ª Turma do STJ (REsp nº 1584441). Segundo a decisão, no processo não haveria motivo que justificasse o receio sobre uma eventual responsabilização, uma vez que a empresa do setor de navegação que entrou com a ação deve ser considerada uma sociedade empresarial domiciliada no Brasil e a sua agência representante poderá responder diretamente, se vencida na demanda, por eventuais encargos decorrentes de sucumbência.

Fonte: https://www.valor.com.br/legislacao/6099883/justica-libera-estrangeiros-de-deposito-previo-para-ajuizamento-de-processo

Guedes quer taxar juros sobre capital e dividendos

O Ministro da economia, Paulo Guedes, disse num almoço fechado, organizado em Davos, na Suíça, pelo Itaú Unibanco, que o governo quer simplificar a tributação, mas vai taxar os dividendos e juros sobre capital próprio. Para o presidente executivo do Bradesco, Octávio de Lazari Junior, o movimento faz sentido. “O que vão fazer e reduzir a carga fiscal sobre a produção e aumentar sobre os ganhos de capital”.

Guedes, apurou o VALOR, também foi contundente sobre a reforma da Previdência Social, assegurando aos investidores que ela será aprovada, com um período transitório de capitalização. E voltou a dizer que, “se por um desastre não for aprovada”, ele tem um plano B.

A taxação de dividendos já está em discussão desde a campanha eleitoral. Mas é a primeira vez que Guedes fala publicamente sobre a isenção tributária dos juros sobre capital próprio, conhecidos nas empresas pela sigla JCP.

As mudanças que estão sendo estudadas por Guedes devem incluir a redução da alíquota do Imposto de Renda para Pessoa Jurídica (IRPJ) provavelmente de 34% para 20%, além do fim da redução dos juros remuneratórios do capital próprio e da distribuição dos dividendos.

Essas mudanças, segundo ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel, não vão necessariamente reduzir a carga tributária, que é dada não apenas pelo tamanho da alíquota cobrada, mas também pela base de cálculo do imposto.

Se as mudanças se confirmarem, Everardo Maciel não tem dúvidas de que “a carga tributária aumentara sobretudo para a s pequenas empresas”. Com a tributação de dividendos, segundo o ex-secretário da Receita, as empresas tributadas pelo regime de lucro presumido e pelo simples (mais de 5 milhões) serão “atingidas de forma perversa”. Atualmente, a distribuição do resultado é isenta do IR, pois o imposto incide sobre o lucro antes da distribuição.

Com a tributação do resultado na distribuição, os sócios das empresas que pagam pelo lucro presumido e pelo Simples teriam os lucros tributados pelo IR, o que não acontece atualmente.

Everaldo alertou também que as mudanças podem provocar, entre outras deformações, o ressurgimento da “distribuição disfarçada de lucros”, um mecanismo de evasão utilizado no passado. Para dirimir o lucro a ser distribuído, os sócios podem, por exemplo, adquirir bens em nome da empresa e utilizá-los.

Fonte: https://www.valor.com.br/compartilhar1/do?share=brasil%2F6079751%2Fguedes-quer-taxar-juros-sobre-capital-e-dividendos

Extinção do contrato de trabalho por comum acordo entre empregado e empregador

As inovações trazidas pela reforma trabalhista.

A CF/88 dispõe em seu art. 7º, inciso I, que são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social, “relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos”.

Tal lei complementar, até hoje, não foi aprovada. E na pendência da regulamentação, a multa rescisória do FGTS é aplicada como indenização substitutiva, a qual, de certa forma, limita a rotatividade nas empresas.

A reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017) trouxe inovações no que se refere às modalidades de extinção do contrato de trabalho. Até então, a extinção ocorria por:

a. ato/fato atribuído ao empregador (resilição unilateral): 1) despedida ou dispensa sem justa causa (sem motivo disciplinar) ou arbitrária (sem qualquer outro motivo: econômico, técnico ou estrutural); 2) despedida ou dispensa indireta (justa causa do empregador – art. 483 da CLT); 3) falência da empresa (art. 449 da CLT – crédito privilegiado); 4) morte do empregador pessoa física (= dispensa sem justa causa/falência, mas só é causa de extinção do contrato se a atividade empresarial for cessada);

b. fato atribuído ao empregado (resilição unilateral): 1) despedida ou dispensa por justa causa (arts. 482 e 158, parágrafo único da CLT); 2) pedido de demissão; 3) morte do empregado (direitos trabalhistas são mantidos, sendo as verbas rescisórias calculadas como se fosse pedido de demissão, as quais são recebidas pelos dependentes habilitados pela Previdência Social);

c. culpa recíproca: justa causa compartilhada (art. 484 da CLT);

d. distrato (resilição bilateral ou por mútuo consentimento): adesão a plano de demissão voluntária (PDV);

e. rescisão (anulação) contratual: contrato declarado nulo de pleno direito (contratação de servidor público sem concurso: tem direito apenas ao salário e saque do FGTS – art. 19-A da Lei nº 8.036/90 e Súmula 363 TST);

f. inadimplemento contratual (ou resolução contratual): 1) extinção do contrato antes do prazo final pré-estipulado, salvo cláusula assecuratória do direito recíproco de rescisão (art. 481 da CLT); 2) extinção de contrato de empregado estável (inquérito para apuração de falta grave, nos termos do art. 492 a 500 da CLT);

g. Por fato atribuído a terceiros: 1) fato do príncipe (factum principis), previsto no art. 486 da CLT; 2) INSS (cessação de aposentadoria por invalidez do empregado substituído, prevista no art. 475, § 2º da CLT);

h. outras causas: 1) caso fortuito ou força maior (art. 502 da CLT); 2) fim do contrato a termo; 3) aposentadoria compulsória do empregado público (art. 40, par. 1º, II da CF/88: 70 ou 75 anos).

Para além do PDV, que tem como característica a prévia negociação coletiva para fixação das regras que regerão o fim do contrato (seja em termos de benefícios, seja no tocante aos eventuais ônus impostos ao trabalhador), a reforma trabalhista instituiu no art. 484-A uma nova modalidade de resilição do contrato de trabalho por mútuo consentimento, ampliando as hipóteses de extinção sem justificativa.

A denominada extinção do contrato de trabalho por acordo entre empregado e empregador difere-se do PDV porque suas regras são previstas em lei e o acordo ocorre entre as partes, sem qualquer negociação coletiva, nem mesmo homologação perante o respectivo sindicato profissional, visto que a previsão da assistência sindical foi extinta pela reforma trabalhista, que revogou o § 1º do art. 477 da CLT.

Contudo, é sabido que alguns sindicatos têm obtido êxito nas negociações coletivas para manter a obrigatoriedade da homologação da rescisão perante à entidade sindical, não apenas para contratos com prazo superior a um ano, que era a previsão legal, como para quaisquer contratos. No caso do distrato por comum acordo, a fim de validar a livre vontade do trabalhador, notoriamente hipossuficiente na relação laboral, tal cláusula normativa adquire especial relevância, sendo desejável que os sindicatos profissionais atuem no sentido de buscar sua inclusão nos instrumentos coletivos.

As verbas rescisórias devidas na extinção do contrato de trabalho por comum acordo, nos termos dos incisos I e II do art. 484-A da CLT, são as mesmas devidas na dispensa sem justa causa, com exceção do aviso prévio indenizado, que será pago por metade, e da multa rescisória do FGTS, que também será devida por metade (20% sobre o saldo da conta vinculada). O saque dos valores depositados no FGTS estará autorizado, mas limitado a 80% do saldo (o restante permanece na conta vinculada do trabalhador, somente admitindo movimentação se ocorrer alguma das outras hipóteses previstas no art. 20 da Lei nº 8.036/90), nos termos do § 1º do art. 484-A. Já o § 2º veda o acesso do trabalhador ao Programa de Seguro-Desemprego, restrição que se justifica pelo fato de a resolução conjunta na extinção do contrato afastar o requisito da imprevisibilidade da perda do emprego, que é o risco que o seguro desemprego visa cobrir.

Quanto ao aviso prévio indenizado, considerando que a reforma não afastou a incidência da Lei nº 12.506/2011, na fixação do período devido, haverá o acréscimo de 3 (três) dias por ano de serviço prestado, até o máximo de 60 (sessenta) dias, perfazendo um total de até 90 (noventa) dias, que será indenizado por metade. No tocante ao aviso prévio trabalhado, a lei nada dispôs, do que se deduz que deva ser cumprido integralmente (30 dias), até porque essa é a regra tanto no pedido de demissão quanto na dispensa sem justa causa, sendo a extinção do contrato por consenso uma combinação das duas espécies. Já a redução da jornada de trabalho em duas horas diárias durante o prazo do aviso prévio trabalhado, entende-se que não será devida, pois o art. 488 refere que é exigível “se a rescisão tiver sido promovida pelo empregador”.

Ademais, a redução da jornada visa possibilitar ao trabalhador dispensado repentinamente a busca de nova colocação no mercado de trabalho, que não será o objetivo deste se o encerramento do contrato foi decorrente de sua manifestação livre de vontade, a qual aderiu o empregador. Por fim, quanto à eventual dispensa de cumprimento do aviso prévio trabalhado, considerando que o TST entende que o direito é irrenunciável pelo empregado e que o pedido de dispensa de cumprimento não exime o empregador de pagar o respectivo valor, salvo comprovação de haver o prestador dos serviços obtido novo emprego (Súmula 276), aplica-se, a princípio, o mesmo entendimento na extinção do contrato por acordo mútuo, contudo, limitada eventual indenização remanescente à metade.

Interessante notar que a extinção do contrato de trabalho por comum acordo tem semelhanças com a rescisão por culpa recíproca. Em conformidade com o previsto no art. 484 da CLT, o empregado tem direito à indenização que seria devida em caso de culpa exclusiva do empregador por metade. A Súmula 14 do TST, detalhando esse dispositivo, revela que a metade também se aplica ao valor do décimo terceiro salário e das férias proporcionais (garantidos na integralidade na extinção por comum acordo), além do aviso prévio (verba tipicamente rescisória). O § 2º do art. 18 da Lei nº 8.036/90 esclarece que a multa do FGTS também será devida por metade (20%). Por outro lado, o inciso I do art. 20 da Lei nº 8.036/90 garante o saque integral do saldo do FGTS, enquanto no comum acordo ocorre a limitação da movimentação ao percentual de 80% do saldo. O acesso ao seguro desemprego também é vedado na rescisão por culpa recíproca.

Na prática, a modalidade de extinção do contrato de trabalho por comum acordo já existia, mas não havia meios de ser formalizada. Normalmente, o empregado que tivesse interesse em findar o contrato procurava o empregador pedindo para ser dispensado para poder sacar o FGTS e receber o seguro-desemprego. O empregador concordava com o pedido, mas impunha a condição de que fosse devolvida a multa do FGTS. Tudo informalmente e com risco de ser considerado fraude. E com razão, visto que também não era incomum a prática de simular o fim do contrato de trabalho apenas para viabilizar o levantamento dos depósitos de FGTS e o recebimento de seguro-desemprego pelo trabalhador (que permanecia na empresa recebendo “por fora”). Ambas as situações eram ilegais.

Com a reforma, a primeira passou a ser legalmente admitida, mas a segunda continua sendo hipótese de fraude trabalhista.

Ainda que a nova modalidade de extinção do contrato demande comum acordo, a tendência é que a iniciativa da extinção do contrato seja do empregado, cabendo ao empregador concordar ou não, a depender do histórico profissional do trabalhador. Quando a iniciativa da dispensa for do empregador, considerando que para o empregado a modalidade é desvantajosa se comparada à dispensa sem justa causa, é improvável que o comum acordo se viabilize em condições de normalidade.

Contudo, é sabido que a subordinação e a assimetria típicas entre os contratantes laborais podem ensejar manifestações de vontade viciadas. A respeito das consequências de um acordo forçado, assim lecionam os Procuradores do Ministério Público do Trabalho Bruno Choairy e Vanessa Martini:

Para essas situações, necessário se socorrer dos dispositivos do Direito Civil quanto aos vícios de vontade, especialmente a coação e lesão, já que, demonstrado vício de consentimento do trabalhador, o negócio será anulável. No primeiro caso, o empregado é compelido a aceitar a rescisão por “comum acordo”, sob a pressão do empregador no sentido de que, não aceitando, nada receberá na rescisão, caracterizando-se a coação ante a existência de fundado temor de não receber nada na rescisão do contrato de trabalho, pelo que anulável o ato jurídico (art. 151 e 171, II, do Código Civil). Na lesão, a anulabilidade da rescisão resulta de o trabalhador, sob a premente necessidade de receber algum recurso durante o período de desemprego, aceitar a rescisão por “comum acordo”, recebendo muito menos do que teria direito caso fosse efetivamente dispensado da empresa, configurando a manifesta desproporção da prestação (art. 157 do Código Civil). Em ambos os casos, a consequência da invalidade desse específico negócio jurídico será a convolação da rescisão por comum acordo em rescisão sem justa causa, por força do princípio da continuidade da relação de emprego (art. 7º, I, CF), dando direito ao recebimento da diferença das verbas rescisórias, além da indenização do seguro desemprego (aplicação analógica da súmula 389 do TST).

Caso o empregador se utilize do instituto para minimizar os custos da rescisão, por depositar apenas metade da multa de FGTS e pagar período inferior de aviso prévio, ausente real vontade do empregado de também rescindir o contrato, poderá estar-se diante de simulação, sendo que, nos termos do artigo 167 do Código Civil, o negócio será nulo, permanecendo a rescisão como sem justa causa fosse, sendo devida a complementação dos valores, além do seguro-desemprego.

Além disso, deve-se ressaltar que o artigo 9º da CLT também pode ser aplicado no caso, sendo nulos os atos que pretendem fraudar a Lei.1

O vício de consentimento, evidentemente, exige provas, ainda que indiciárias.

De acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgados pelo extinto Ministério do Trabalho, com cerca de um ano de vigência da reforma trabalhista já haviam sido extintos quase 110 mil contratos de trabalho por comum acordo.

Conforme levantamento realizado pela subseção do Dieese da Central Única dos Trabalhadores (CUT), a média salarial e o tempo de serviço dos trabalhadores que assinaram esse tipo de acordo são maiores do que todas as outras modalidades de demissão. Enquanto a média salarial dos demitidos sem justa causa (maioria dos casos) é de R$ 1.740,20, a média dos desligados por “comum acordo” é de R$ 2.135,66. Além disso, foi identificado que esses trabalhadores tinham, em média, três anos e nove meses de empresa; já os que foram demitidos sem justa causa trabalhavam, em média, dois anos e sete meses na empresa.2

Em tempos de crise econômica, marcados por acentuados níveis de desemprego, não é crível que tantos trabalhadores estejam deixando seus postos de trabalho por livre iniciativa, ainda que aliada à vantagem de receber parte das verbas rescisórias que não seriam devidas em caso de mero pedido de demissão. De todo modo, os números oficiais indicam elevada “adesão” à novidade. Só o tempo dirá se o afastamento do Brasil dos parâmetros da Organização Internacional do Trabalho (OIT), consubstanciados na Convenção 158 (que veda a dispensa injustificada, mas foi denunciada por meio do Decreto nº 2.100, de 20 de dezembro de 1996) indica evolução ou retrocesso.

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1 LIMA, Bruno Choairy Cunha de; MARTINI, Vanessa. Das Inovações No Contrato Individual De Emprego. In. ZIMMERMANN, Cirlene Luiza… [et al]. Reforma Trabalhista Interpretada. 2. ed. Caxias do Sul: Plenum, 2017, p. 164-165.

2 Disponível em: <https://www.cut.org.br/noticias/mais-de-109-mil-trabalhadores-fizeram-acordo-de-demissao-e-perderam-direitos-80b2>. Acesso em: 22 jan. 2019.

(*) Cirlene Luiza Zimmermann é Procuradora do Trabalho – MPT. Mestre em Direito pela Universidade de Caxias do Sul – UCS. Professora Universitária. Coordenadora da Revista Juris Plenum Previdenciária.

Fonte: JOTA, por Cirlene Luiza Zimmermann, 24.01.2019

É possível reduzir o prazo de prescrição trabalhista previsto na Constituição?

Ascensão e queda da PEC nº 300/16.

Tramitou no Congresso Nacional a polêmica Proposta de Emenda Constitucional n.º 300/16, que pretendeu promover relevantes alterações no art. 7º da Constituição de 1988: a) elevação da duração diária do trabalho a dez horas, b) revogação da proporcionalidade do aviso prévio (que estaria, então, limitado a trinta dias em qualquer caso), c) reconhecimento da prevalência do negociado em convenções e acordos coletivos sobre a legislação, d) submissão obrigatória de qualquer demanda trabalhista à Comissão de Conciliação Prévia (em uma curiosa hipótese de legislative override, uma vez que o Supremo Tribunal Federal decidiu, por ocasião do julgamento das ADI’s 2139, 2160 e 2237, que tal obrigatoriedade seria incompatível com o princípio constitucional da inafastabilidade do Judiciário), e)redução do prazo prescricional, que passaria a ser de dois anos, limitado a três meses após a extinção do contrato. De acordo com a proposta, o atual prazo quinquenal tornar-se-ia bienal, ao passo que o atual prazo bienal (após a cessação do vínculo) passaria a ser trimestral.

A aludida proposta foi apresentada na Câmara dos Deputados em 20/12/2016, permanecendo praticamente sem movimentações durante cerca de dois anos. Em 09/01/2019, a PEC recebeu parecer favorável da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

A Proposta veio a ser arquivada em 31/01/2019, por decisão da Mesa Diretora da Câmara, sem, entretanto, realização de qualquer juízo de mérito em relação ao seu conteúdo. Isso porque o arquivamento decorreu meramente da aplicação do art. 105 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, de acordo com o qual “finda a legislatura, arquivar-se-ão todas as proposições que no seu decurso tenham sido submetidas à deliberação da Câmara e ainda se encontrem em tramitação”.

A tramitação da PEC na Câmara, especialmente diante da possibilidade de apresentação de projeto de conteúdo assemelhado com o reinício da atividade parlamentar em 2019, suscita uma questão: é possível reduzir o prazo de prescrição trabalhista previsto na Constituição Federal?

Para responder à indagação, convidamos o leitor a uma breve digressão histórica1 em torno da criação do atual prazo prescricional trabalhista consagrado no art. 7º, inciso XXIX, da CF/88 e a uma mirada sobre a regulamentação da matéria no Direito Comparado. Ao final, discutiremos os critérios adotados na PEC e a viabilidade (ou não) da redução do prazo prescricional sob o ponto de vista constitucional.

A criação dos atuais prazos prescricionais no Direito brasileiro

A prescrição consiste em ato-fato jurídico caducificante cujo suporte fático é composto pela inação do titular do direito em relação à pretensão exigível e pelo decurso do tempo fixado em lei2. Com a oposição da exceção (em sentido material) da prescrição ou, na atualidade, sua pronúncia ex officio, encobre-se a eficácia da pretensão3. Não há, entretanto, extinção do direito ou da ação processual.

A inclusão do prazo de prescrição trabalhista no corpo da Constituição não integra a tradição legislativa brasileira — assim como não corresponde, aliás, à tradição ocidental, tratando-se de matéria tipicamente infraconstitucional. Por isso, a Carta de 1988 foi a primeira no Brasil a alçar o tema ao status constitucional.

Em sua redação original, a Consolidação das Leis do Trabalho, acompanhando a diretriz fixada no Decreto-Lei n.º 1.237/39 e no Decreto n.º 6.596/40 (Regulamento da Justiça do Trabalho), previa somente o prazo prescricional de dois anos, contados da ocorrência da lesão (arts. 11, 119 e 143).

Na última metade da década de 1980, no contexto de redemocratização do País e de elaboração de uma nova Constituição, a ideia de inclusão da disciplina acerca do prazo prescricional trabalhista em seu texto foi objeto de acirrada discussão.

No Anteprojeto de Constituição concebido pela Comissão Afonso Arinos, constava expressamente, em seu art. 343, a impossibilidade de fluência do prazo prescricional durante a vigência da relação de emprego.

A partir do estudo dos textos votados pelos parlamentares na Assembleia Constituinte, é possível observar que, inicialmente, não houve a criação de qualquer dispositivo sobre a matéria, o que perdurou inclusive até a elaboração do Substitutivo 1 e do Substitutivo 2. Apenas na fase posterior à apresentação deste é que o tema passou a constar nas minutas da nova Lei Maior.

Os debates na Constituinte foram riquíssimos, com a apresentação de emendas que acolhiam diferentes visões sobre a prescrição trabalhista, das quais é possível destacar as seguintes: a) prescrição de dez anos no curso do contrato e de dois anos após sua extinção, observando-se sempre a prescrição parcial (ex.: Emenda 28.159); b) vedação à fluência da prescrição durante o contrato de emprego, sendo seu prazo de dois anos após o término do vínculo (ex.: Emendas 28.835, 31.885, 22.956, 32.976, 10.010, 18.356, 19.368, 1.388, 22.727, 29.631, 14.946, 7.238, 4.640, 158, 17.435, 257); c) vedação à fluência da prescrição durante o contrato de emprego, sendo seu prazo de um ano após o término do vínculo (Emenda 10.042); d) prescrição quinquenal em relação a trabalhadores urbanos e, quanto aos rurais, prescrição de dois anos, contados apenas após a cessação da relação (ex.: Emenda 1.888); e) prescrição bienal no curso do contrato e após sua extinção, acolhendo-se o parâmetro consagrado na CLT (ex.: Emendas 236 e 26); f) prazo geral de prescrição trabalhista trienal (ex.: Emenda 602); g) prazo quinquenal no curso do contrato, contado da lesão ao direito, e bienal após seu término (ex.: Emenda 646); h) prescrição de cinco anos para o trabalhador urbano, até o limite de dois anos após a extinção do contrato, sendo, quanto ao rural, de até dois anos após a extinção do contrato (Emenda 1.755); i) impossibilidade de regulação do tema da prescrição no texto da nova Constituição, por tratar-se de matéria tipicamente afeta à legislação infraconstitucional (vide, por exemplo, os pareceres pela rejeição das Emendas 28.159, 28.835 e 31.885).

Prevaleceu, ao final, a seguinte redação do art. 7º, inciso XXIX, da Constituição de 1988: “XXIX – ação, quanto a créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de: a) cinco anos para o trabalhador urbano, até o limite de dois anos após a extinção do contrato; b) até dois anos após a extinção do contrato, para o trabalhador rural”.

O dispositivo que veiculou a ampliação do prazo em favor dos trabalhadores urbanos não gozava de efeitos retroativos, não afetando a prescrição bienal já consumada à época da promulgação da nova Lei Maior. A fim de sanar dúvidas sobre o tema, houve por bem o Tribunal Superior do Trabalho editar, em 1992, a Súmula n.º 308, pacificando tal entendimento.

Ademais, de maneira didática, a SDI-I da Corte consolidou, em sua Orientação Jurisprudencial n.º 204, a diretriz de contagem retroativa do prazo prescricional quinquenal a partir da data da propositura da reclamação, de modo que todas as pretensões cujo termo inicial situe-se nesse período estão a salvo da prescrição, desde que observado o biênio posterior ao término do contrato para o ajuizamento. O enunciado viria a ser, em 2005, incorporado à Súmula n.º 308.

Em maio de 2000, foi promulgada a Emenda Constitucional n.º 28, que, em enorme prejuízo aos trabalhadores rurais, unificou a prescrição de empregados urbanos e rurais, conferindo nova redação ao art. 7º, inciso XXIX, da CF/88, que permanece vigente até a atualidade: “XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho”.

A PEC n.º 300/16 pretendeu promover nova alteração no citado dispositivo, que passaria a contar com a seguinte redação: “XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, obrigatoriamente submetida à Comissão de Conciliação Prévia, prevista em lei, com prazo prescricional de dois anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de três meses após a extinção do contrato de trabalho”.

Exposto, ainda que brevemente, o contexto histórico de concepção do atual prazo de prescrição trabalhista, cumpre-nos conhecer algumas experiências estrangeiras no desenvolvimento da matéria.

A prescrição trabalhista no Direito Comparado

Consoante assinalado anteriormente, a previsão do prazo prescricional trabalhista no texto constitucional não integra a tradição ocidental. Em regra, a matéria é disciplinada na legislação infraconstitucional. Uma das raras exceções residia na Constituição peruana de 1979 (revogada pelo texto de 1993, atualmente vigente), que previa o prazo de quinze anos para cobrança dos créditos decorrentes da relação de emprego.

Conhecer o tratamento jurídico conferido à questão em outros ordenamentos oferece elementos para compreensão, com maturidade e senso crítico, do nosso próprio cenário nacional. Naturalmente, um juízo comparativo mais aprofundado exigiria a consideração das peculiaridades jurídicas de cada país, especialmente no tocante aos regimes de garantia de emprego e às técnicas processuais para sua efetivação, o que ultrapassa os limites propostos para o presente texto.

Para a tarefa de comparação, selecionamos três grupos de países: a) integrantes do Mercosul, dada a evidente vinculação social e econômica com o Brasil; b) nações da América Latina com mais elevados Produtos Internos Brutos, de acordo com dados de 2017, excetuado o próprio Brasil, evidentemente; c) países europeus cuja cultura jurídico-trabalhista influenciou (e continua a influenciar) de maneira mais intensa a realidade normativa brasileira.

No primeiro grupo, encontramos a Argentina, o Uruguai, o Paraguai e a Venezuela. Vale recordar que esta última encontra-se suspensa de todos os direitos e obrigações inerentes à sua condição de Estado Parte do Mercosul, com fundamento no Protocolo de Ushuaia sobre Compromisso Democrático.

Na Argentina, a Lei n.º 20.744/76 prevê o prazo de prescrição trabalhista de dois anos (art. 256), inclusive em relação à responsabilidade civil por acidente de trabalho ou doença ocupacional, contados da determinação da incapacidade ou do falecimento da vítima (art. 258).

À semelhança do Brasil, o Uruguai também adota um sistema bipartido de prazos: a Lei n.º 18.091/07 consagra o prazo de cinco anos (art. 2º), observando-se, entretanto, a limitação ao prazo de um ano após a cessação da relação de emprego para o exercício da pretensão (art. 1º).

No Paraguai, o Código do Trabalho (Lei n.º 203/93) prevê o prazo geral de um ano para a prescrição trabalhista (art. 399), além de algumas situações específicas nas quais o prazo para ajuizamento da respectiva ação é de seis meses (art. 400): nulidade de um contrato celebrado por erro ou coação, desconstituição de contrato por motivos previstos em lei ou postulação de indenização por despedida injustificada.

A seu turno, na Venezuela, a Lei Orgânica do Trabalho, dos Trabalhadores e das Trabalhadoras (Decreto n.º 8.938/12) consagra a regra geral do prazo prescricional de cinco anos, computados da extinção do contrato de emprego (art. 51). Não há fluência da prescrição, portanto, no curso do vínculo empregatício.

No segundo grupo de países, encontramos México, Colômbia e Chile. Os cenários legislativos da Argentina e da Venezuela, cujo enquadramento, em 2017, também seria possível neste segundo grupo, já foram abordados acima. Está também excluído, obviamente, o próprio Brasil.

A Lei Federal do Trabalho, no México, prevê, como regra geral, o prazo prescricional de um ano, contado a partir da exigibilidade do crédito (art. 516). São, todavia, estabelecidos prazos específicos, com maior ou menor extensão, para o manejo de determinadas ações: a) dois anos para postular o pagamento de indenizações por acidentes de trabalho ou doenças ocupacionais, bem como para exigir o cumprimento de decisões das “Juntas de Conciliación y Arbitraje” e das convenções celebradas perante elas (art. 519); b) dois meses para pleitear reintegração ou indenização por trabalhadores despedidos (art. 518); c) um mês para o empregador promover a despedida do funcionário, aplicar-lhe sanção por infração contratual ou realizar desconto em seu salário, bem como para o trabalhador postular o equivalente à rescisão indireta do contrato (art. 517).

Na Colômbia, o Código do Trabalho estabelece o prazo prescricional trabalhista geral de três anos (art. 488). No mesmo sentido é a previsão contida no Código Processual do Trabalho e da Seguridade Social (art. 151).

Também acolhendo, aos moldes brasileiros, um sistema bipartido de contagem do prazo prescricional, o Código do Trabalho do Chile prevê, em seu art. 510, o prazo de dois anos, contados da exigibilidade da pretensão, observando-se o limite de seis meses após o término do contrato de emprego. O mesmo dispositivo legal estipula o prazo prescricional específico de seis meses para a cobrança de horas extraordinárias, contados da data em que deveria ter sido realizado seu pagamento, bem como para o manejo de ação em que se postule a nulidade da despedida, computados aqui a partir do encerramento da prestação dos serviços.

No terceiro grupo de países, visualizamos Portugal, Espanha e Itália, sem prejuízo, naturalmente, do reconhecimento da influência exercida sobre o Brasil pela experiência desenvolvida em outros ordenamentos estrangeiros.

O Código do Trabalho de Portugal prevê apenas o prazo prescricional de um ano, contado a partir do término do contrato (art. 337), não correndo a prescrição durante a vigência do vínculo empregatício.

O item 1 do art. 59 do Estatuto dos Trabalhadores da Espanha sugere a adoção da mesma diretriz como regra geral, isto é, prazo prescricional trabalhista de um ano, iniciado somente a partir da cessação do vínculo. Trata-se, no entanto, de mera aparência, uma vez que a cláusula de exceção contida no item 2 do mesmo dispositivo revela-se tão ampla a ponto de alcançar inúmeras hipóteses no cotidiano laboral. Com efeito, de acordo com este item, o prazo prescricional será de um ano, a contar da data da exigibilidade do crédito, para cobrança de prestações econômicas ou para cumprimento de obrigações consistentes em ato único do empregador. Na prática, portanto, de modo geral, o prazo prescricional corresponde a um ano, iniciando-se não com a extinção do contrato, mas da data em que se torna possível a cobrança do crédito.

Os itens 3 e 4 do mesmo artigo consagram o prazo de vinte dias para manejo de ação destinada à impugnação de despedida ou resolução de contrato temporário, bem como determinação empresarial de alteração contratual substancial.

Na Itália, o prazo prescricional trabalhista encontra-se previsto no Código Civil, sendo de cinco anos para créditos de prestação periódica e daqueles decorrentes da extinção contratual (art. 2.948, itens 4 e 5), sendo aplicável o prazo ordinário de dez anos para as pretensões em relação às quais não esteja previsto prazo específico (art. 2.946). O diploma prevê, ainda, hipóteses de prazos prescricionais de um ano ou três anos, de acordo com a exigibilidade de verbas em períodos de até um mês (art. 2.955, 2) ou superior a esse patamar (art. 2.956, 1).

A questão do termo inicial do prazo de prescrição trabalhista no ordenamento italiano merece especial atenção. Isso porque a Corte Constitucional daquele país, considerando que a dependência do emprego para subsistência própria e da família tende a inviabilizar o ajuizamento de ação pelo trabalhador em face do seu patrão (haveria, aqui, de acordo com o Tribunal, um obstáculo material ao exercício do direito de ação) e a irrenunciabilidade do salário (extraída do art. 36 da Constituição italiana), assentou, na Sentença n.º 63/19664, que as regras que estabelecem a prescrição em relação a prestações trabalhistas são constitucionais, mas o termo inicial do respectivo prazo somente poderá deflagrar-se com a extinção do contrato, sob pena de configuração de renúncia de direitos pelo trabalhador. Trata-se, inequivocamente, de decisão inspirada na teoria contra non valentem agere non currit praescriptio5.

Anos depois, na Sentença n.º 174/1972, a Corte Constitucional restringiu a extensão dos beneficiários do entendimento anteriormente fixado, limitando-a àqueles trabalhadores não alcançados pela garantia contra despedidas prevista na Lei n.º 604/1966 e no Estatuto dos Trabalhadores, pois apenas eles estariam submetidos ao obstáculo material à propositura de ação anteriormente mencionado. Em relação aos empregados que contam com a garantia contra a despedida, o prazo prescricional flui normalmente na constância do contrato.

Como se nota, a prescrição trabalhista possui regramento bastante diversificado nos países analisados.

Em alguns deles, veda-se a própria fluência do prazo durante a relação de emprego, a exemplo de Portugal, da Espanha (com as inúmeras exceções albergadas pelo Estatuto dos Trabalhadores), da Itália (por construção da Corte Constitucional) e da Venezuela, sendo oportuno recordar que, ao menos em relação aos trabalhadores rurais, era essa a regra vigente no Brasil até o advento da Emenda Constitucional n.º 28/00.

Adotam um sistema de “bipartição” dos prazos prescricionais, com a fixação específica de um prazo fatal após a cessação do liame empregatício, além do Brasil, o Uruguai e o Chile.

De modo geral, os prazos variam de um ano (Paraguai e Espanha, por exemplo) a cinco anos (Itália, Uruguai e Venezuela), podendo, excepcionalmente, chegar a dez anos no ordenamento italiano. No caso chileno, chama a atenção o curto prazo específico de seis meses para cobrança do pagamento pela prestação de horas extraordinárias.

Analisando com vagar alguns dos prazos mais exíguos expostos anteriormente, é facilmente constatável que, embora denominados de prescricionais nas respectivas legislações6, referem-se, em verdade, ao exercício de ações desconstitutivas (ou constitutivas negativas), fundadas no manejo de um direito potestativo, possuindo, portanto, em verdade, natureza decadencial7. Não surpreende, assim, dado o elevado grau de interferência sobre a esfera jurídica de terceiros, que os prazos sejam mais curtos8.

A partir do exame dos quadros legislativos verificados em outras nações, é perceptível que o constituinte brasileiro de 1988 engenhosamente concebeu uma interessante solução para a questão da prescrição trabalhista: não assegurou a imprescritibilidade das pretensões no curso do contrato de emprego (ressalvada a situação do empregado rural, que viria a ser modificada doze anos depois, uniformizando-se os prazos prescricionais), mas estabeleceu o considerável prazo de cinco anos, sem dúvida levando em conta que dificilmente o trabalhador ajuíza a reclamação durante a vigência da relação empregatícia. Manteve, porém, o prazo fatal de dois anos após a extinção contratual (já previsto na CLT e na Lei do Rural), ponderando que tal duração corresponderia a um ponto de equilíbrio entre a incerteza do patrão quanto à possibilidade de ser demandado e um período razoável para o trabalhador buscar direitos que entende indevidamente negados.

A PEC n.º 300/16 objetivou alterar esse cenário, conforme já relatamos, estabelecendo no Brasil o menor prazo geral de prescrição após a cessação contratual em comparação com os países do Mercosul, com aqueles com os mais elevados PIB’s da América Latina e com Portugal, Espanha e Itália, países europeus que influenciaram (e influenciam) decisivamente o Direito do Trabalho pátrio. Cumpre-nos agora analisá-la de maneira específica.

É possível reduzir os prazos da prescrição trabalhista?

A PEC n.º 300/16 pretendeu modificar a redação do inciso XXIX do art. 7º da CF/88, que passaria a ser a seguinte: “ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, obrigatoriamente submetida à Comissão de Conciliação Prévia, prevista em lei, com prazo prescricional de dois anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de três meses após a extinção do contrato de trabalho”.

Convém rememorar que o arquivamento da Proposta consistiu em mera consequência da aplicação do procedimento previsto no art. 105 do Regimento Interno da Câmara, não da conclusão quanto à inadequação do seu conteúdo. Em verdade, sob a ótica substancial, a PEC havia recebido a chancela da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania poucos dias antes do arquivamento.

Não se deve descartar, portanto, o horizonte de oferecimento, em breve, de nova Proposta sobre o tema, dotada de conteúdo assemelhado.

Na justificativa da Proposta9, dois fundamentos foram apresentados para a alteração constitucional pretendida, conforme trecho adiante transcrito: “Nos termos da atual disposição constitucional, o trabalhador tem o prazo de até dois anos, após o término do contrato de trabalho, para ingressar com ação judicial que verse sobre a reparação de direitos que entende lesados. Esse prazo, todavia, é demasiadamente longo e, por isso, nocivo ao empresariado e à sociedade em geral, pois a dificuldade de manter-se arquivo documental relativo à relação empregatícia extinta e a complicada situação de localizarem-se testemunhas contemporâneas aos fatos objeto do litígio inviabilizam a defesa judicial do empregador reclamado”. Assim, a dificuldade para a guarda de documentos e para convidar testemunhas seriam as razões para a mudança proposta.

Na leitura da justificativa da PEC, é inevitável a percepção de que se trata de uma alteração com o declarado objetivo de melhoria da condição social dos empregadores, desafiando a lógica das modificações legislativas em matéria trabalhista imposta pelo caput do art. 7º da Carta de 1988.

Superada a perplexidade da primeira impressão, uma reflexão mais detida sobre os motivos expostos na Proposta evidencia que, concessa maxima venia, eles não se sustentam.

Se a preocupação do legislador recai sobre as dificuldades para o arquivamento de documentos, talvez o mais eficiente fosse a promoção de uma grande revisão dos prazos prescricionais brasileiros, já que a legislação trabalhista responde apenas por pequena parte do “problema”.

Com efeito, é possível, de maneira simplificada, reunir as principais relações jurídicas mantidas pelas empresas em quatro grupos: a) com fornecedores e parceiros comerciais em geral; b) com a Fazenda Pública (nas esferas federal, estadual e municipal); c) com consumidores; d) com seus empregados.

Tanto no caso das obrigações perante a Fazenda Pública quanto em relação àquelas contraídas quanto aos consumidores, o prazo prescricional aplicável é de cinco anos, conforme disciplinam, respectivamente, o art. 174 do Código Tributário Nacional e o art. 27 do Código de Defesa do Consumidor.

No tocante aos contratos firmados com fornecedores e parceiros comerciais em geral, é relevante recordar que o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do EREsp 1.280.825 sob a relatoria da Ministra Nancy Andrighi, firmou a tese jurídica de acordo com a qual “nas controvérsias relacionadas à responsabilidade contratual, aplica-se a regra geral (art. 205 CC/02) que prevê dez anos de prazo prescricional”10. Isto é, as pretensões decorrentes de inadimplemento contratual no Direito Comum prescrevem em dez anos, incidindo o disposto no art. 205 do Código Civil.

Logo, em comparação às demais relações jurídicas ordinariamente mantidas pelas empresas, nada há de exótico no prazo constitucional da prescrição trabalhista, especialmente considerando-se que, decorridos dois anos após a cessação do vínculo, nenhuma pretensão poderá ser exercitada (ressalvados, obviamente, os casos de lesão pós-contratual).

Destaque-se, ainda, que o menor prazo prescricional previsto no rol do art. 206 do Código Civil é de um ano, ao passo que a PEC em análise pretendeu reduzir o prazo de prescrição após a extinção contratual para apenas três meses. O cotejo com um exemplo extraído do referido dispositivo auxilia a adequadamente compreender a desproporcionalidade da Proposta: a prevalecer a alteração prevista na PEC, o prazo prescricional aplicável ao trabalhador cujo contrato foi encerrado corresponderá a 1/4 do prazo prescricional previsto quanto à pretensão dos credores não pagos contra os sócios ou acionistas e os liquidantes, quando do encerramento da liquidação da sociedade, em um típico caso de antinomia imprópria valorativa.

Por isso, se, em momento futuro, vier a ser aprovada uma nova redação do art. 7º, inciso XXIX, da CF/88, com a fixação do prazo prescricional após a extinção do vínculo em apenas três meses, certamente uma das preocupações daqueles que militam cotidianamente com o Direito do Trabalho será tentar oferecer uma explicação plausível para a escolha do prazo.

É digno de nota o fato de a PEC n.º 300/16 não ter sido acompanhada por qualquer estudo técnico que justificasse a definição do aludido prazo. Por que três meses? Por que não seis, doze, dezoito ou trinta meses? Qual critério científico, qual fundamento sistemático, qual estudo empírico lastreia a consagração exatamente do prazo de três meses?

O segundo motivo apresentado como justificador da Proposta consiste na “complicada situação de localizarem-se testemunhas contemporâneas aos fatos objeto do litígio inviabilizam a defesa judicial do empregador reclamado”.

Partindo da premissa de que qualquer setor de Recursos Humanos minimamente organizado possui a relação dos antigos empregados e que é plenamente possível a consulta aos dados informados pela própria empresa na RAIS ao longo dos anos, é realmente difícil visualizar a “complicada situação” referida na justificativa mesmo quanto a ex-funcionários sem contato com a empresa e que eventualmente tenham alterado seu endereço (além do número de telefone celular, endereço de e-mail e perfis de redes sociais, facilmente acessíveis na atualidade…), uma vez que o ex-empregador poderá informar os dados de identificação do trabalhador ao Judiciário e, explicitando suas dificuldades, requerer a utilização por este de ferramentas (a exemplo do sistema INFOJUD) que permitam o conhecimento do seu endereço, solicitando, se for o caso, sua intimação judicial (CPC/15, art. 455, §4º, inciso II).

À fragilidade das justificativas da PEC n.º 300/16 aliava-se o claro traço da inconstitucionalidade.

A drástica redução dos prazos prescricionais colide frontalmente com a determinação contida no caput do art. 7º da CF/88 quanto à melhoria da condição social dos trabalhadores, em descompasso, pois, com a vedação ao retrocesso social. Em momento algum da história do Direito do Trabalho brasileiro conheceu-se tão exíguo prazo prescricional.

Ao consagrar o prazo prescricional na Lei Maior, o constituinte decidiu inequivocamente por uma proteção qualificada do acesso à Justiça em âmbito trabalhista, tornando-o imune a investidas de maiorias parlamentares eventuais que propugnem pela redução da sua extensão.

É bem verdade, porém, em desfavor dessa tese, que o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior do Trabalho, reconhecendo larguíssima margem de discricionariedade em matéria de prescrição ao constituinte reformador, têm convivido harmoniosamente com a Emenda Constitucional n.º 28/00, que unificou os prazos prescricionais de trabalhadores urbanos e rurais, extinguindo o regime de não fluência da prescrição no curso do contrato que existia em favor destes11.

Paralelamente, não se deve olvidar que, conquanto a prescrição trate-se de instituto de Direito Material, é inegável sua vinculação à efetiva realização do direito fundamental de acesso à Justiça, consoante já destacado. Prazos excessivamente curtos podem até atender, sob perspectiva formal, tal direito, uma vez que o cidadão disporá de alguma possibilidade de provocação do Poder Judiciário, mas definitivamente não concretizam, sob ótica substancial, o direito fundamental. O cenário torna-se ainda mais delicado diante da exigência estabelecida como regra geral pela Lei n.º 13.467/17 quanto à indicação do valor dos pedidos, ainda que por estimativa (Instrução Normativa n.º 41/18, art. 12, §2º, do TST), em razão do tempo necessário para apuração pelo Advogado trabalhista da dimensão dos créditos que entende devidos ao seu cliente.

De fato, especialmente em relação ao prazo trimestral, sua exiguidade é flagrante, seja em confronto com outros prazos no ordenamento pátrio (correspondendo a apenas 1/4 do menor prazo previsto no art. 206 do CC/02), seja em cotejo com a realidade normativa relativa à prescrição trabalhista em outros países.

Acerca da atuação estatal (inclusive legislativa) em extensão inferior à necessária para proteção de um direito fundamental, lecionam Ingo Wolfgang Sarlet, Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero: “Por outro lado, poderá o Estado frustrar seus deveres de proteção atuando de modo insuficiente, isto é, ficando aquém dos níveis mínimos de proteção constitucionalmente exigidos ou mesmo deixando de atuar – hipótese, por sua vez, vinculada (ao menos em boa parte) à problemática das omissões inconstitucionais. É neste sentido que – como contraponto à assim designada proibição de excesso – expressiva doutrina e inclusive jurisprudência tem admitido a existência daquilo que se convencionou chamar de proibição de insuficiência (no sentido de insuficiente implementação dos deveres de proteção do Estado e como tradução livre do alemão Untermassverbot). É por tal razão que também a doutrina brasileira (e, em alguns casos, a própria jurisprudência), em que pese não ser pequena a discussão a respeito, em geral já aceita a ideia de que o princípio da proporcionalidade possui como que uma dupla face, atuando simultaneamente como critério para o controle da legitimidade constitucional de medidas restritivas do âmbito de proteção de direitos fundamentais, bem como para o controle da omissão ou atuação insuficiente do Estado no cumprimento dos seus deveres de proteção. Em suma, desproporções – para mais ou para menos – caracterizam violações o princípio em apreço e, portanto, antijuridicidade, no sentido de uma inconstitucionalidade da ação estatal”12.

Logo, ainda que se venha a admitir, à luz da jurisprudência do STF e do TST, a possibilidade de redução do prazo prescricional trabalhista consagrado na Constituição (a exemplo do ocorrido em relação aos empregados rurais), a diminuição jamais poderá ser implementada de maneira desproporcional, tornando ínfimo o prazo, a ponto de inviabilizar o efetivo acesso à Justiça.

Assim, em nossa visão, a redução do prazo prescricional em termos como os propugnados pela Proposta de Emenda Constitucional n.º 300/16 encontra insuperáveis obstáculos no princípio da vedação ao retrocesso social e na proporcionalidade, na vertente da vedação à proteção insuficiente.

Por esses motivos, parece-nos que Propostas assemelhadas sequer poderiam ser objeto de deliberação no Congresso Nacional, considerando a proibição contida no art. 60, §4º, inciso IV, da Constituição Federal de 1988. Ao largo da controvérsia quanto à abrangência ou não dos direitos sociais pela expressão “direitos e garantias individuais”, é inequívoco que o acesso à Justiça erige-se como direito individual (dotado, a propósito, de especial caráter fundamental, já que se afirma como pressuposto à garantia e à fruição de inúmeros outros direitos no Estado Democrático).

À guisa de conclusão

A Proposta de Emenda Constitucional n.º 300/16 pretendeu alterar substancialmente os prazos da prescrição trabalhista. Seu arquivamento, após parecer favorável da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, decorreu de mero procedimento formal previsto no art. 105 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, de modo que não se deve descartar o horizonte de oferecimento, em breve, de nova Proposta sobre o tema, dotada de conteúdo assemelhado.

A eventual aprovação futura de projeto nos termos cogitados na PEC n.º 300/16 significaria, a um só tempo:

a) enorme retrocesso social, em evidente violação do caput do art. 7º da CF/88, com a adoção do menor prazo de prescrição trabalhista da história brasileira, correspondendo o prazo trimestral proposto a somente 1/4 do menor prazo prescricional previsto no art. 206 do Código Civil;

b) a criação no Brasil do menor prazo geral de prescrição após a cessação contratual em comparação com os países do Mercosul, com aqueles com os mais elevados PIB’s da América Latina e com Portugal, Espanha e Itália, países europeus que influenciaram (e influenciam) decisivamente o Direito do Trabalho pátrio;

c) restrição excessiva ao acesso à Justiça, especialmente em relação ao momento posterior à cessação do vínculo empregatício, em colisão com a vedação à proteção insuficiente, desdobramento da proporcionalidade.

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1 Para aprofundamento na análise histórica da prescrição trabalhista na realidade normativa brasileira, vide FERNANDEZ, Leandro; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Tratado da Prescrição Trabalhista: Aspectos Teóricos e Práticos. São Paulo: LTr, 2017.

2 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado: Parte Geral. Tomo VI. Rio de Janeiro: Borsoi, 1955, § 665, 1 e 3.

3 Ibidem, § 695, 6.

4 O conteúdo da decisão pode ser acessado em <https://www.cortecostituzionale.it/actionPronuncia.do>.

5 Sobre o tema, vide: PAMPLONA FILHO, Rodolfo; FERNANDEZ, Leandro. Prescrição Trabalhista e a Teoria Contra Non Valentem Agere Non Currit Praescriptio. RJLB – REVISTA JURÍDICA LUSO-BRASILEIRA, v. 4, p. 1255-1278, 2018.

6 A dificuldade em relação à identificação da prescrição e da decadência pelo legislador em variados ordenamentos jurídicos foi apontada por precisão por Miguel Reale no conhecido opúsculo “Visão Geral do Projeto de Código Civil”, disponível em: http://www.miguelreale.com.br/artigos/vgpcc.htm.

7 Acerca da distinção entre os institutos da prescrição e da decadência, recomendamos fortemente ao amigo leitor a leitura de paradigmático trabalho: AMORIM FILHO, Agnelo. Critério científico para distinguir a prescrição da decadência e para identificar as ações imprescritíveis in MENDES, Gilmar Ferreira; STOCO, Rui (Org.). Coleção doutrinas essenciais: Direito Civil, Parte Geral. v. 5. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

8 Pondera Agnelo Amorim Filho acerca da gravidade da afetação da esfera jurídica de outras pessoas em razão do exercício de direitos potestativos: “As considerações feitas acima levam, inevitavelmente, à conclusão de que, quando a lei, visando à paz social, entende de fixar prazos para o exercício de alguns direitos potestativos (seja exercício por meio de simples declaração de vontade, como o direito de preempção ou preferência; seja exercício por meio de ação, como o direito de promover a anulação do casamento), o decurso do prazo sem o exercício do direito implica na extinção deste, pois, a não ser assim, não haveria razão para a fixação do prazo. Tal consequência (a extinção do direito) tem uma explicação perfeitamente lógica: É que (ao contrário do que ocorre com os direitos suscetíveis de lesão) nos direitos potestativos subordinados a prazo o que causa intranquilidade social não é, propriamente, a existência da pretensão (pois deles não se irradiam pretensões) nem a existência da ação, mas a existência do direito, tanto que há direitos desta classe ligados a prazo, embora não sejam exercitáveis por meio de ação. O que intranquiliza não é a possibilidade de ser exercitada a pretensão ou proposta a ação, mas a possibilidade de ser exercido o direito. Assim, tolher a eficácia da ação, e deixar o direito sobreviver (como ocorre na prescrição), de nada adiantaria, pois a situação de intranquilidade continuaria de pé” (Ibidem, p. 42/43).

9 Disponível em <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2121866>.

10 EREsp 1280825/RJ, Relatora Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 27/06/2018, DJe 02/08/2018.

11 Vide, a propósito, as Orientações Jurisprudenciais n.º 271 e 417 da SDI-I do TST, bem como a decisão proferida no RE 570532, em que o STF posicionou-se pela ausência de repercussão geral da questão concernente à aplicabilidade da nova regra prevista na EC n.º 28/00 ao contrato firmado antes da sua promulgação, mas extinto apenas após seu advento.

12 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. 2 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 349/350.

Fonte: JOTA, por Leandro Fernandez, Juiz do Trabalho do TRT, da 6ª Região, 07.02.2019